Garagem

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a Lisboa de Ulisses.

Terminei, ao final da manhã, o romance «A Cidade de Ulisses» de Teolinda Gersão. Uma história do amor real em toda a sua complexidade, uma história de amor em e com Lisboa.
Paulo Vaz, personagem principal, narrador, é convidado pelo CAM (Centro de Arte Moderna) a fazer uma exposição sobre a cidade e, como artista de renome, seria de esperar que a resposta fosse sim, mas o aceitar ou não dessa proposta faz com que Paulo olhe em retrospectiva toda a sua vida. A par com a situação que o país atravessa, Teolinda faz-nos embarcar numa viagem pelo Portugal de há trinta anos atrás, leva-nos pela mão numa Lisboa dos anos 80, do FMI, saltitando entre o antes e o agora da 'Cidade de Ulisses', entre a lenda e a História. 
Lisboa como paisagem. Como cenário. Lisboa berço. Paulo e Cecília partem na busca (in)consciente de uma Lisboa só deles, dos seus passos, dos seus olhos, dos seus sentidos. É nela que se encontram, que se amam, que se perdem e reencontram. 

«Uma cidade construída pelo nosso olhar, que não tinha de coincidir com a que existia. Até porque também essa não existia realmente, cada um dos dez milhões de portugueses e dos milhões de turistas que por ela andavam tinha de Lisboa a imagem que lhe interessava, bastava ou convinha. Não havia assim razão para termos medo de tocar-lhe, podíamos (re)inventá-la, livremente.» p. 33

É através de Paulo e Cecília que regresso a Bea e Luís, sempre Luís. Ao contrário de Ulisses e Penélope, a história de Bea e Luís nunca foi uma história de espera, mas de urgência. Nunca houve promessas de regressos ou de toda uma vida. Houve entrega e momentos. Bea amou Luís com a calma de Cecília. E tal como Cecília também partiu.

Lisboa foi cenário, foi paisagem. E Bea, ao contrário de Paulo, teve medo de tocar-lhe de a estragar, de a mudar. Não enfrenta Lisboa por sabê-la diferente, por sabê-la nunca mais igual à Lisboa que os namorou. 


Bea e Luís nada têm que ver com esta «Cidade de Ulisses», têm apenas que ver com a Lisboa que conheci. 

«A Cidade de Ulisses», Teolinda Gersão
Sextante Editora