das leituras enroladas.

ando há dias com "a desumanização" na mala. terminei a última leitura - "A Minha Pequena Livraria" de Wendy Welch. Ed. noites brancas - e ando a ganhar coragem para esventrar o valter. perdão, o do valter. Ler apetece sempre, pior são os dias em que enrolamos leituras, e há razões mais legítimas do que outras para o fazer. não, nada tem a ver com a polémica que se levantou em torno de uma entrevista do autor. não a vou pronunciar. tem a ver com o arrebatamento que os livros do valter hugo mãe trazem consigo. e este já vem com carga emocional de leituras partilhadas.
respiro fundo umas quantas vezes enquanto lhe olho a capa de soslaio. passo a mão pelo objecto-livro e o meu coração já está acelerado sem chegar ao primeiro parágrafo. é mais ou menos assim o ritual do começo de um livro. é uma espécie de religião. 
é saber que depois disto, não somos os mesmos. 

 

bibliotecas cheias de fantasmas.

A biblioteca protege da hostilidade exterior, filtra os ruídos do mundo, atenua o frio que reina em volta, mas confere, igualmente, uma sensação de omnipotência. Porque a biblioteca faz recuar as pobres capacidades humanas: ela é um concentrado de tempo e de espaço. Reúne nas suas prateleiras todos os estratos do passado. Ali estão os séculos que nos precederam.
«A escrita (...) grande, muito grande ao permitir-nos conversar com os mortos, com os ausentes, com aqueles que não chegaram a nascer, através de todas as distâncias do tempo e do espaço».
— jacques bonnet, «bibliotecas cheias de fantasmas». Trad. de José Mário Silva

Bonsai

«No final ela morre e ele fica sozinho, embora na realidade tivesse ficado sozinho vários anos antes da morte dela, de Emília. Digamos que ela chama-se ou chamava-se Emília e que ele chama-se, chamava-se e continua a chamar-se Júlio. Júlio e Emília. No final Emília morre e Júlio não morre. O resto é literatura:»

Alejandro Zambra

 
Um livro dentro de um livro... que cabe num conto. É mais ou menos isto. Lê-se, na badana, que Jorge Luís Borges aconselhava a escrever como se se estivesse a redigir o resumo de uma obra já escrita. E é isso que Alejandro Zambra faz com 'bonsai'. Um romance-resumo, um romance-bonsai.  
É a história de Júlio e de Emília, mas mais de Júlio com Emília... e sem Emília. Um livro recheado de referências literárias. 

 

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«My house, I say...»*

Capa: Carlos César sobre fragmento de «A Onda», de Renoir.

Capa: Carlos César sobre fragmento de «A Onda», de Renoir.

«A primeira impressão que teve, foi de que conhecia aquele lugar. A sala com as cortinas afastadas e uma janela aberta, mas onde o ar fresco parecia não entrar. As paredes cobertas de estantes até ao tecto. Havia ali um pesado cheiro a rosas e lilases e fumo de tabaco, e livros velhos. As jarras estavam cheias de lilases, e uma abelha esvoaçava entre as flores da mais próxima. 
A lareira estava apagada e fazia frio.»

«Às vezes tenho a impressão de que sabemos, intimamente, tudo o que nos vai acontecer.»


só a sei sentir. não me peçam para escrever sobre a Ana Teresa Pereira, que pareço uma tontinha a balbuciar: flores, cheiros, mar, casa, amor, ela.... ela.... ela... Eu...

* Robert Louis Stevenson