Querido avô,
Há dias em que as palavras nos saem quase arrancadas ao peito.
Pensei que fosse mais fácil escrever-te, porque me é sempre tão mais fácil escrever o que vai cá dentro, mas descobri que me dói sempre um pouco mais a cada ano que passamos sem ti. A tua ausência é-me cada vez mais real e não mais fácil, como ingenuamente supus que se tornasse. Pensei que o tempo lavasse as feridas, curasse as mágoas, que com ele as memórias se tornariam mais leves e que acabaríamos por aceitar a tua partida como a ordem natural...
mas não.
Pode ser de mim, pode ser de te termos deixado partir sem que te pedíssemos que nos falasses de ti, mas nunca foste de grandes conversas e julgo que te vou percebendo melhor agora, com o correr do tempo.
escuta, tenho tanto medo de me esquecer do teu riso.
Olha, voltei a Grândola, - como se te fosse reencontrar por lá... - sei que não foste assim tão feliz, nesse tempo, mas foi a terra que te trouxe a avó, que nos trouxe a nós todos, 4 filhos, 3 noras, 1 genro e 8 netos. Sei, também, que não querias lá voltar, que querias deixar a aldeia sem olhar para trás, e que assim o fizeste. Também nunca falámos sobre isto, nunca chegámos a esta fase da vida, talvez seja por isto que me custa cada vez mais a tua ausência, não poder ouvir-te.
Comigo, guardo as cartas que escreveste, as que pediste para queimar, ainda bem que a avó nunca teve a coragem de o fazer, é assim que te vou mantendo vivo junto a mim, é assim que vou conversando contigo, no silêncio.
Farias 82 anos hoje.
E eu gostava de estar ao pé de ti para te ajudar a soprar as velas, para te abraçar, para te poder responder ao que perguntavas à avó vezes e vezes sem conta, no início da vossa história:
"Para quê tanto amor"? para isto, avô.
meu querido avô.
Com amor,
Inês