Sines, 23 de Junho de 2015

a Antónia.
há coisas que precisam de ser escritas para que se celebrem. 


casar não é, não deveria ser, um passo leve. não se pensa em casar de hoje para amanhã, é uma decisão ponderada, trabalhada, é um passo que se dá porque faz sentido e não porque tem de ser, porque é melhor, ou porque a família quer e quer já. connosco aconteceu assim, a família queria, claro, mas nós só decidimos quando decidimos.
contudo, casar não deixa de ser uma decisão de peso, mesmo depois de feita. 

na véspera do meu casamento todo o meu corpo estava no núcleo de um tornado. a cabeça estava num turbilhão de memórias e o coração completamente perdido. não sei se algum dia desceram ao Poço Iniciático na Quinta da Regaleira, em Sintra, mas se não o fizeram acho que deviam fazê-lo pelo menos uma vez na vida (com guia!). o que senti nesse final de dia foi próximo da descida iniciática, como se caísse em mim toda a simbologia do Poço, como se tivesse descido às trevas de mim mesma... para renascer. e chorei, chorei muito. 

a Antónia, amiga da minha mãe - amiga física: de poucos anos, de coração: quase de uma vida - que acompanhou todo este processo de planeamento de casamento até ao último dia para as decorações finais, com o seu coração tamanho mundo e no meio de todo o meu pranto pré-matrimonial, pegou na minha mão e puxou-me a um mundo só dela, tudo o que me disse naquele instante pareceu encaixar-se nas falhas do meu pensamento andarilho. As coisas, as pessoas, as memórias, têm a importância que lhes dermos e importante era o dia que ia acontecer dali a umas horas, isso era importante, o meu coração era importante, tudo o resto eram estilhaços que dificilmente cola alguma uniria.  

serve o presente desabafo para isto: há pessoas que nos tocam de formas tão simples e tão naturais que elas próprias não sabem o quão foram importantes neste e naquele momento da nossa vida. a Antónia é já parte da família, é unânime, e não atravessa, "hoje", um momento fácil. e por isso desejo, celebrando-a, que as minhas palavras e o amor que nelas ponho lhe tragam um pouco mais de força, à força enorme que só uma mulher como ela carrega.