Restaurar a fé.

Não sou uma pessoa religiosa. Fui criada no meio de uma família materna de testemunhas de Jeová e de uma família paterna católica, não praticante. Vivemos Natais diferentes da maioria dos nossos amigos, assinalávamos a data mas não tínhamos presépio, não tínhamos árvore de natal ou decorações alusivas. Sempre comemorámos aniversários, e habituei-me desde cedo a não ter por perto os meus avós maternos nessas datas. No 5º ano, a minha mãe inscreveu-me nos Salesianos de Manique, escola católica. Cresci, assim, no meio de duas religiões… e não me apeguei a nenhuma. Havia muita coisa que não me fazia sentido, nem de um lado, nem do outro, e decidi que não acreditava em Deus.

A morte do meu Avô Materno, em 2004, e a sua recusa em aceitar uma transfusão de sangue que o poderia (talvez) salvar, fizeram-me amaldiçoar esse Deus em que ele tanto acreditava.

Fruto da perda, não sei, escolhi acreditar que quem parte fica connosco, ainda que num plano diferente. Que ele estaria sempre à distância de uma conversa no silêncio. E agarrei-me a isso, a tratar os meus mortos por tu, como quem nunca parte. A pedir-lhes auxílio sempre que a vida doía um pouco mais.

Quando descobri o Druidismo, pareceu-me que podia adoptar esta filosofia de vida e fazer dela a minha religião. Não creio num Deus, creio no amor, creio na Natureza, na alma que viaja entre mundos. Acredito que quando fechamos os olhos aqui, algures, de um outro lado, abriremos outros olhos. E acredito que a Vida é preciosa de mais para nos perdermos neste mundo pequenino que habitamos. Não sei se é real, mas não preciso que o seja, acreditar traz-me a paz e o conforto que necessito.

A nossa vida mudou no dia em que engravidámos. Receber esta criança foi mais do que uma experiência física, mais do que simples biologia, foi sentir que esta alma chegava a nós no momento certo e que nos estava destinada. Não está a ser uma gravidez tranquila, está a ser uma gravidez amada, desejada, sonhada, trouxe desafios que não imaginávamos e que, a seu tempo, deles falarei. As 3 últimas semanas mostraram-nos a força que carregamos dentro, mas também me fizeram duvidar de todas as minhas crenças, do Deus que inventei para mim, da minha intuição, da minha sanidade e poder de decisão. Não foi a minha filha que o fez, foram terceiros. Eu deixei que me fosse roubada a fé, no amor, em mim, na nossa família.

E, quando eu deixei de acreditar, a nossa família criou uma barreira forte para chorarmos juntos, uma rede gigante que nos suporta aos três nestas acrobacias emocionais, e os amigos, sem saberem, contavam-nos histórias de esperança e de crença… aos poucos, dei por mim a orar. Não sei a quem rezo, mas agradeço todos os dias a filha que carrego no útero, a família que nos calhou, os amigos que nos lêem a alma. E peço que lhes chegue de volta todo o amor e força que nos entregam diariamente.

Não lhe chamo Jeová, nem Jesus Cristo, chamo-lhe Amor… é isso que nos dá sentido à vida. O Futuro, não o leio, mas acredito hoje que o amor nos abre caminhos e que “enquanto houver estrada para andar a gente vai continuar.”